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Foto: Marcelo Soares |
Muitas
vezes me questionam por que eu ainda trabalho, mesmo tendo Esclerose Múltipla e
a minha resposta é sempre a mesma: “Porque trabalhando eu me sinto o mais
normal e útil possível”. Comecei a trabalhar, oficialmente, em 2010 e até 2013,
poucos no ambiente de trabalho sabiam que eu era esclerosada. Antes disso,
porém, passei uns 2 anos dando aulas particulares, preferencialmente, de
matemática, química e biologia. Eu era a típica “professora muito maluquinha”! De
fato, de 2008 a 2013, durante os 6 primeiros anos de esclerose, nem mesmo todos
os meus amigos sabiam da doença.
Mas,
como lidar com todos os sintomas diários no decorrer da labuta? No meu
caso, lido como se não estivesse num ambiente de trabalho. No geral, ignoro-os,
mas quando não é possível, deixo claro tudo o que sinto para os colegas que
estão em volta. Certamente, ser servidora pública concursada e trabalhar,
predominantemente, sentada, facilita tudo. Se assim não o fosse, possivelmente,
já estaria aposentada e é por isso que não julgo meus colegas esclerosados e do
lar. Meu horário cotidiano é de 9-18h, sendo que costumo trabalhar de 12-18/19h ou 20h. Além disso, às vezes, trabalho de casa. Tento compensar todas as
horas não trabalhadas com velocidade de raciocínio, qualidade e
comprometimento. Vivo trabalhando pela internet em fins de semana, feriados,
férias, pelo celular (até dentro do ônibus) e/ou tarde da noite em casa. Já já,
assim que finalizar esse texto, vou escrever um projeto. Não faço isso para ser
melhor do que ninguém e me sentir heroína, mas, para me sentir NORMAL e,
sobretudo, por acreditar na força do trabalho, independente da natureza dele. Por
sorte, no meu emprego posso criar e ser livre. Amo tanto o que faço e tenho
chefes tão pacientes que parece até que trabalho para mim mesma. Logicamente,
nem sempre são flores e sei que já deixei de assumir cargos (o que significa
dinheiro) por ser esclerosada, o que me deixa triste além de beeemmmm irritada,
afinal, NUNCA deixei de assumir
responsabilidades por ser doente. Já fiz tanta coisa que vocês cairiam no riso,
desde reunião sozinha com prefeita de cidade pequena (sendo eu, gerente
substituta e de graça) até servir café! Volta e meia viajo pelos lugares mais
bonitos do estado, aqueles onde os ricos passam fim de semana/feriados e
férias! Além da minha missão com o meio ambiente e com o planeta, adoro ser
útil, ainda que menos remunerada do que gostaria e quase nunca valorizada! o
principal: TUDO ISSO JÁ BEMMM
ESCLEROSADA!! Há 8 anos, desde o diagnóstico, tenho uma medula que parece
mais um queijo suiço, de tantos buracos na mielina!
Ah Liane, mas você deve morar numa cidade agradável... Moro
na capital do RJ e trabalho na Praça Mauá, bem ali do “ladinho” da
“#cidadeolimpica”. É absurdamente quente, bem poluída, quase tão engarrafada
quanto São Paulo, perigosa, pra quem não conhece. Mas, MARAVILHOSA para quem visita! Resumindo: É uma dureza sair da cama
e ir trabalhar de ônibus todos os dias, mesmo sem Esclerose! Imaginem sendo NOTURNA DESDE SEMPRE, tipo um lula
molusco pela manhã, amando dormir, e ESCLEROSADA?
Mas, “eu vou que vou” do melhor jeito que consigo! Ultimamente, tenho pego
tantos táxis, que não me admira que meu salário não esteja sendo suficiente, e
que eu ande dependendo de “irmãtrocínio”. Mas, ainda assim, eu vou! Vou porque
trabalhar me anima, preenche meu dia, me dá motivos para seguir e, a longo
prazo, aumenta meus triênios.
Mas, quando você falta, se sente mal?
Então, me sinto desconfortável, sim. Mas, muito menos do que se tivesse que
sair da minha casa para passar mal, não produzir nada e ainda chegar no
trabalho, apenas para desequilibrar o ambiente dos meus colegas. Dia após dia,
venho aprendendo a me respeitar cada vez mais.
Mas, eu não consigo mesmo trabalhar fora! Você quer que eu
me sinta mal com seu texto, né? Não,
NÃO, DEFINITIVAMENTE NÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃOOOOOO! Quem disse que só fora se
trabalha?? Conheço esclerosados que ralam tanto em casa que me deixam cansada
só de ler!
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Fonte: Acervo pessoal |
Mas, em casa é diferente! Eu
discordo! Trabalho é trabalho e, se é para o bem, dignifica e torna a vida
produtiva. Afinal, como disse no meu último texto: “A vida é muito curta para se APEQUENAR.”
Mas, em casa eu não sou remunerado? E daí?
Eu pergunto! Hoje digo que tenho ao menos quatro trabalhos! O primeiro é aquele
que paga meu salário! O segundo é
escrever para a ABCEM e tentar ajudar em tudo o que posso! A maioria não
sabe, mas me convidei para entrar na ABCEM, pois queria que as palavras
alcançassem mais gente do que no meu blog pessoal! Agora já sabem como e porque
essa menina do RJ surgiu na associação de Esclerose Múltipla do ABC paulista. O
terceiro é moderar páginas no facebook para ajudar esclerosados como eu e o
quarto é escrever em diversos grupos, tentando esclarecer o máximo de dúvidas
que eu puder sobre a doença, seu diagnóstico, sintomas, tratamentos, tipos etc.
Além
disso, tento escrever meu próprio blog, milito em prol de questões políticas
que me são caras e, muito raramente, ajudo minha irmã em campanhas solidárias,
totalmente voluntárias [ando dormindo demais (umas 10h por noite), não sei bem
o porquê, e portanto, está faltando tempo, infelizmente]. Chamo tudo isso de
trabalho, não pelo quanto sou (nada) famosa nem paga, mas pelo quanto me
comprometo com essas temáticas. Cada um dos elogios e agradecimentos me faz tão
feliz que preenchem lacunas antes imensas. Hoje, não faço mais terapia e ando
me sentindo bem completa, resolvida e mais calma, APENAS escrevendo. Cada vez
mais cheia de vontade e de ideias, além de alguns projetos e sonhos. Tenho
entendido que não é preciso abrir um negócio para ser empreendedor, sendo
possível empreender com a própria vida todos os dias, mantendo a positividade e
a vontade de viver!
Liane Moreira
Bióloga
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